Na continuidade do plano que tinha previsto para os meus artigos de blog, nesta e na próxima semana falar-vos-ei do pintor Júlio Carmo Santos. Estes dois artigos terão o mesmo propósito que aqueles que fiz sobre a pintora Paula Rego, nas semanas anteriores. Assim o primeiro artigo, o de hoje, será de carácter biográfico, e o segundo artigo, o da próxima semana, consistirá numa reflexão sobre a importância dos artistas do nosso concelho e sobre a relação pintor – público que se consolida, por exemplo, através de aulas de pintura para comunidade. Esta reflexão deve-se ao facto de Júlio Carmo Santos ser meu professor de pintura há vários anos, e também à exposição que o nosso grupo está a realizar (nesta e na próxima semana) sobre a arte na década de 90, onde eu abordo esta relação referindo a divulgação de museus e a de espaços onde qualquer elemento da comunidade pode aprender e entender a pintura.
Júlio Carmo Santos, mestre e pintor, nasceu em Alenquer a 1941, e define-se como aguarelista, figurativo e impressionista.
Apesar de não ter conhecido o seu avô materno, que era caricaturista e aguarelista, o gosto e o engenho para o desenho ficaram nos genes e desde muito cedo que manifestou esta tendência, aliás, antes de saber ler, escrever ou contar já esboçava as paisagens que via.
O seu primeiro mestre foi Duarte D’Almeida, que reparou nas capacidades do pintor, e por volta de 1951 Carmo Santos ingressou na Casa Pia de Lisboa, por parecer a hipótese mais sensata devido à sua condição de órfão de pai. Foi nesta instituição que recebeu a formação em vários ofícios, destacando-se a modelação e pintura orientada pelo Mestre Martins Correia, a função de bate-chapas, serralheiro e encadernador. Mais tarde frequentou as oficinas de S. José onde aprendeu desenho industrial e terminou na Fundação Ricardo Espírito Santo, como desenhador imobiliário.
Como o trabalho de pintor só por si não sustenta uma família, Carmo Santos teve vários empregos, maquetista, ilustrador gráfico, criativo em agências de publicidade, que, de uma maneira ou de outra, estiveram sempre relacionados ao desenho e à pintura.
Na década de 90 o pintor instala-se em Alverca onde dedica-se inteiramente ao projecto cultural da cidade, e em 1992 criou um espaço de formação artística na Sociedade Filarmónica de Recreio Alverquense (SFRA) por onde já passaram imensos alunos.
Júlio Carmo Santos foi o fundador e primeiro presidente do GART – Grupo de Artistas Amigos da Arte, um projecto que tem vindo a evoluir contando com cada vez mais intervenções em conjunto com a Câmara Municipal de Vila Franca de Xira.
Com 68 anos, Júlio Carmo Santos continua a pintar e a ensinar com a mesma vivacidade a que nos habituou.
ANEXO
«Arquivo: Edição de 04-12-2008
O mestre dos sete ofícios
Foi o primeiro presidente do Grupo de Artistas e Amigos da Arte (GART) e o seu nome é, para muitos, sinónimo de mestria. Aos quatro anos Júlio Carmo Santos já rabiscava umas paisagens no papel. Aos 67 continua de pincéis e tintas na mão. Mas com a técnica mais amadurecida. História de um homem que se fez mestre de gerações de ribatejanos. E que um dia sonhou ser padre e toureiro.
O seu primeiro grande mestre poderia ter sido o avô materno que, além de conservador do Registo Civil de Alenquer, era caricaturista e aguarelista. Mas o pintor Júlio Carmo Santos, residente em Alverca, teve a pouca sorte de não ter conhecido a pessoa que lhe assinou a cédula de nascimento. Todavia ficou-lhe nos genes a queda para os rabiscos no papel.
Muito antes de conhecer os números e as letras já Júlio Carmo Santos, hoje com 67 anos, misturava as cores no papel. Desenhos de paisagens que via da sua janela. Vivia em Alenquer e a sua aptidão para o desenho já era notória. Dessa altura recorda o mestre Duarte D’Almeida e os conselhos que o então presidente da Câmara Municipal de Alenquer dava à sua mãe para que o “menino” prosseguisse estudos na Escola Industrial, em Lisboa.
Júlio Carmo Santos tinha 10 anos e por ser órfão de pai a solução passou pela Casa Pia de Lisboa. Entrou na Escola de Pina Manique, experiência que recorda com agrado, apesar de nas camaratas existirem mais de 60 camas. “Lembro-me da grande cidade, íamos muito aos Jerónimos e éramos todos camaradas”. Recorda também todos os ofícios que experimentou: bate-chapas, serralheiro, mecânico, entalhador, encadernador. Foi ainda na Casa Pia que Carmo Santos se cruzou com um dos mestres que mais o marcou: o professor de Benavente e mestre em modelação, Martins Correia. Nesse tempo passou-lhe pela cabeça seguir uma carreira eclesiástica, mas houve um padre que o dissuadiu. Hoje, diz que a fé que tem é relativa. “Não nego que exista qualquer coisa de sobrenatural que nos rege, mas quantos mais anos vamos vivendo, vamos encarando a fé de outra maneira. Deus está dentro de cada um de nós”.
Da Casa Pia saltou para os Salesianos, onde a devoção era ainda mais intensa. “Mas os padres eram uns porreiros”. Nas oficinas de São José aprendeu desenho industrial que finalizou na Fundação Ricardo Espírito Santo, como desenhador mobiliário. Foi por esta altura que conheceu novas oficinas: alfaiataria, sapataria e tipografia. Teve também uma pequena experiência no teatro, onde foi colega de Manuel Cavaco, hoje actor profissional.
O primeiro emprego conseguiu-o na oficina Dallas, onde foi maquetista. Depois integrou um atelier de publicidade que lhe viria a dar acesso a Leitão de Barros, seu mestre em conhecimentos cenográficos. Saltitou de agência em agência de publicidade e pelo meio travou conhecimentos com Raquel Roque Gameiro e Tomaz de Mello, com quem colaborou na arquitectura de interiores e stands. “A verdade é que estive sempre ligado ao lápis ao papel e à tinta”.
No início da década de 90 mudou-se para Alverca e começou a dedicar-se à cidade. Conheceu Adriano Gabriel que o puxou para os corpos directivos da Filarmónica Alverquense. Em 1992 criou uma ala de formação de pintura artística na Filarmónica. Começou a ensinar desenho e pintura. De lá para cá já lhe passaram pelas mãos quase uma centena de pessoas. “Chamam-me mestre e eu costumo dizer que sou o mestre dos sete ofícios, por vezes palhaço, e gosto”, exclama.
Júlio Carmo Santos define-se como aguarelista, figurativo e impressionista. “Os meus temas roçam quase sempre os assuntos das paisagens rurais e também gosto do retrato”. Gosta de pintar os avieiros, a lezíria, o Tejo e a mangas do rio. De preferência quando está sol ou nevoeiro. “Um quadro para ter beleza tem de ter contrastes. Tem de ter sol ou nevoeiro, tem de ter uma impressão”. Diz que nunca pintou um comboio, mas quer faze-lo em breve. E explica que uma aguarela que demore mais de três horas a fazer já não é uma aguarela. “A aguarela tem de ser espontânea”. Tem quadros que não são negociáveis, como o “Acácio”, o seu antigo cão. “ Não o venderia nunca. Porque nunca mais o poderia desenhar. Não faço outra peça igual. O Acácio já cá não está”.
Acredita que para se ser pintor é preciso ter coragem e que a primeira lição que ensina aos seus alunos é que “devem trazer as mãos, os olhos e de preferência bom gosto” para aulas. “Não vivo da arte, mas da reforma e das aulas que dou aqui na Filarmónica. É muito difícil viver só da arte em Portugal e não falo só da pintura”, conclui. Desde 1980 que Júlio Carmo Santos tem vindo a participar em exposições colectivas e individuais, de Norte a Sul do país. Ao todo são quase uma centena. Arrecadou vários prémios e menções honrosas. Está representado no Museu João Mário de Alenquer, em várias autarquias e colecções particulares. É o co-autor do monumento ao trabalhador-rural, em Arruda dos Vinhos e do Monumento ao 25 de Abril, em Alverca.
Apreciador dos quadros clássicos e modernos
O seu primeiro grande mestre poderia ter sido o avô materno que, além de conservador do Registo Civil de Alenquer, era caricaturista e aguarelista. Mas o pintor Júlio Carmo Santos, residente em Alverca, teve a pouca sorte de não ter conhecido a pessoa que lhe assinou a cédula de nascimento. Todavia ficou-lhe nos genes a queda para os rabiscos no papel.
Muito antes de conhecer os números e as letras já Júlio Carmo Santos, hoje com 67 anos, misturava as cores no papel. Desenhos de paisagens que via da sua janela. Vivia em Alenquer e a sua aptidão para o desenho já era notória. Dessa altura recorda o mestre Duarte D’Almeida e os conselhos que o então presidente da Câmara Municipal de Alenquer dava à sua mãe para que o “menino” prosseguisse estudos na Escola Industrial, em Lisboa.
Júlio Carmo Santos tinha 10 anos e por ser órfão de pai a solução passou pela Casa Pia de Lisboa. Entrou na Escola de Pina Manique, experiência que recorda com agrado, apesar de nas camaratas existirem mais de 60 camas. “Lembro-me da grande cidade, íamos muito aos Jerónimos e éramos todos camaradas”. Recorda também todos os ofícios que experimentou: bate-chapas, serralheiro, mecânico, entalhador, encadernador. Foi ainda na Casa Pia que Carmo Santos se cruzou com um dos mestres que mais o marcou: o professor de Benavente e mestre em modelação, Martins Correia. Nesse tempo passou-lhe pela cabeça seguir uma carreira eclesiástica, mas houve um padre que o dissuadiu. Hoje, diz que a fé que tem é relativa. “Não nego que exista qualquer coisa de sobrenatural que nos rege, mas quantos mais anos vamos vivendo, vamos encarando a fé de outra maneira. Deus está dentro de cada um de nós”.
Da Casa Pia saltou para os Salesianos, onde a devoção era ainda mais intensa. “Mas os padres eram uns porreiros”. Nas oficinas de São José aprendeu desenho industrial que finalizou na Fundação Ricardo Espírito Santo, como desenhador mobiliário. Foi por esta altura que conheceu novas oficinas: alfaiataria, sapataria e tipografia. Teve também uma pequena experiência no teatro, onde foi colega de Manuel Cavaco, hoje actor profissional.
O primeiro emprego conseguiu-o na oficina Dallas, onde foi maquetista. Depois integrou um atelier de publicidade que lhe viria a dar acesso a Leitão de Barros, seu mestre em conhecimentos cenográficos. Saltitou de agência em agência de publicidade e pelo meio travou conhecimentos com Raquel Roque Gameiro e Tomaz de Mello, com quem colaborou na arquitectura de interiores e stands. “A verdade é que estive sempre ligado ao lápis ao papel e à tinta”.
No início da década de 90 mudou-se para Alverca e começou a dedicar-se à cidade. Conheceu Adriano Gabriel que o puxou para os corpos directivos da Filarmónica Alverquense. Em 1992 criou uma ala de formação de pintura artística na Filarmónica. Começou a ensinar desenho e pintura. De lá para cá já lhe passaram pelas mãos quase uma centena de pessoas. “Chamam-me mestre e eu costumo dizer que sou o mestre dos sete ofícios, por vezes palhaço, e gosto”, exclama.
Júlio Carmo Santos define-se como aguarelista, figurativo e impressionista. “Os meus temas roçam quase sempre os assuntos das paisagens rurais e também gosto do retrato”. Gosta de pintar os avieiros, a lezíria, o Tejo e a mangas do rio. De preferência quando está sol ou nevoeiro. “Um quadro para ter beleza tem de ter contrastes. Tem de ter sol ou nevoeiro, tem de ter uma impressão”. Diz que nunca pintou um comboio, mas quer faze-lo em breve. E explica que uma aguarela que demore mais de três horas a fazer já não é uma aguarela. “A aguarela tem de ser espontânea”. Tem quadros que não são negociáveis, como o “Acácio”, o seu antigo cão. “ Não o venderia nunca. Porque nunca mais o poderia desenhar. Não faço outra peça igual. O Acácio já cá não está”.
Acredita que para se ser pintor é preciso ter coragem e que a primeira lição que ensina aos seus alunos é que “devem trazer as mãos, os olhos e de preferência bom gosto” para aulas. “Não vivo da arte, mas da reforma e das aulas que dou aqui na Filarmónica. É muito difícil viver só da arte em Portugal e não falo só da pintura”, conclui. Desde 1980 que Júlio Carmo Santos tem vindo a participar em exposições colectivas e individuais, de Norte a Sul do país. Ao todo são quase uma centena. Arrecadou vários prémios e menções honrosas. Está representado no Museu João Mário de Alenquer, em várias autarquias e colecções particulares. É o co-autor do monumento ao trabalhador-rural, em Arruda dos Vinhos e do Monumento ao 25 de Abril, em Alverca.
Apreciador dos quadros clássicos e modernos
O museu preferido do pintor Júlio Carmo Santos é o Museu de Orsay, em Paris, França. Ou não fosse o mestre adorar todos os impressionistas. Desde Manet, a Cézanne, passando por Van Gogh. Também gosta dos expressionistas como Picasso “sobretudo na fase-rosa” e de Dali. Dos portugueses gosta particularmente da obra de José Malhoa, Medina, Columbano Bordalo Pinheiro e Alfredo Keill. Diz a brincar que se pudesse roubaria todos os quadros clássicos e modernos.
O mestre que também quis ser toureiro
Quando vivia em Alenquer o pintor Júlio Carmo Santos queria ser toureiro. Na escola primária o único divertimento era uma “tourinha” (uma roda de bicicleta com dois cornos à frente). Chegou mesmo a “desviar” capas vermelhas das procissões para treinar. Hoje em dia continua a gostar da festa brava, mas reconhece que já foi mais aficionado.
GART, um projecto conseguido
Júlio Carmo Santos fundou o Grupo de Artista Amigos da Arte em conjunto com Viriato Pires, José Fidalgo, Jorge Alexandre e Maria Fernanda de Alhandra. Foi o primeiro presidente desta casa e hoje julga que foi um projecto conseguido. “ Cada vez mais o GART tem vindo a intervir com a Câmara Municipal de Vila Franca de Xira e tem sido convidado para fazer pinturas ao vivo pelo país inteiro o que é muito positivo”. »
1 comentário:
ah ganda sô júlio!
Enviar um comentário